Autor de massacre na Nova Zelândia é identificado e levado a tribunal


O autor do massacre em Christchurch, na Nova Zelândia, foi apresentado a um tribunal em Wellington, capital do país, na manhã deste sábado no horário local.

O australiano Brenton Harrison Tarrant, 28, teve sua identidade confirmada pela Justiça neozelandesa, que determinou sua prisão sem possibilidade de fiança ao menos até a próxima audiência, agendada para 5 de abril.

Levado à presença de um juiz, Tarrant, que estava algemado e vestia um uniforme prisional branco, foi formalmente acusado de homicídio.

Segundo a AFP, o militante de extrema-direita ouviu impassível as acusações.

As fotografias divulgadas trazem o rosto dele borrado por ordem do juiz, Paul Kellar, que mencionou a preservação do direito de defesa do acusado.

ENTENDA O CASO

Durante 17 minutos, uma conta atribuída a Brenton Tarrant transmitiu ao vivo pelo Facebook, nesta sexta (15, no Brasil, noite de quinta, 14), o massacre realizado por ele contra duas mesquitas na cidade neozelandesa de Christchurch, que terminou com 49 mortos.

As imagens mostram o próprio Tarrant, um australiano de 28 anos, invadindo a mesquita de Al Noor, no centro da cidade.

As autoridades neozelandesas criticaram a divulgação das imagens, que continuavam disponíveis horas após o ocorrido, em redes sociais .

Ele é recebido no local com a saudação “Olá, irmão” e, em seguida, abre fogo contra os frequentadores.


O atirador, vestido com trajes militares, capacete e colete a prova de balas, percorreu todas as salas da mesquita, disparando contra os presentes, que tentavam fugir.

Mesmo após matar muitas pessoas, ele voltava a disparar contra os corpos no chão.

Mais de 200 pessoas estavam no local no momento do ataque.

A sexta-feira é um dia sagrado para os muçulmanos, equivalente ao sábado dos judeus e ao domingo dos cristãos.

Muçulmanos costumam rezar cinco vezes ao dia, durante toda a semana, mas não necessariamente em uma mesquita. A reza de sexta-feira ao meio dia tem um valor especial e normalmente é feita na mesquita, junto a familiares e amigos.

Num determinado momento, Tarrant deixa a mesquita e caminha em direção ao seu carro. Na rua, atira em uma pedestre antes de voltar à mesquita.


Depois do ataque contra a primeira mesquita, houve tiros no centro islâmico Linwood —Tarrant foi acusado de ser o autor dos dois episódios, mas não se sabe se ele teria agido sozinho.

Uma segunda pessoa, Daniel John Burrough, 18, foi denunciada por incentivar crimes de ódio. Os atos foram classificados pelas autoridades como terroristas.

No total a polícia deteve quatro pessoas após o ataque: Tarrant, Burrough e outros duas que não foram identificadas —uma delas foi liberada.

VÍTIMAS

Foram confirmadas as mortes de 41 pessoas na mesquita de Al Noor e sete na de Linwood. Uma vítima morreu no hospital. Outras 42 ficaram feridas, duas em estado grave —uma delas é uma criança de quatro anos.

Presente na mesquita no momento do ataque, Ramzan Ali disse à emissora TVNZ que viu um homem ser atingido. “Eu só pensava que ele [o atirador] precisava ficar sem balas”, declarou.

“O que eu fiz foi basicamente esperar e rezar: Deus, por favor, acabe com a munição dele.”

Farid Ahmed, que usa cadeiras de rodas, participava das orações.

“Estava tudo calmo. Quando o imã começa a falar, todo mundo fica em silêncio, você pode ouvir um alfinete caindo”, afirmou à Radio New Zealand.
“Mas, de repente, começou o ataque no salão principal. Não vi quem estava atirando, mas vi que algumas pessoas estavam fugindo, passando pelo cômodo onde eu estava. Também vi algumas pessoas sangrando e mancando”, completou.

A primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern, disse que entre as vítimas há pessoas de diversos países, como Paquistão, Arábia Saudita, Turquia, Indonésia e Malásia.

O ACUSADO

A premiê Ardern afirmou que Brenton Tarrant não possui o status de residente na Nova Zelândia e que ele morava no país há apenas três meses. Antes disso, passou sete anos viajando pelo mundo.

Revelou ainda que ele tinha permissão para ter armas no país.

Tarrant trabalhou em uma academia na cidade de Grafton, a 612 km de Sidney, na Austrália, entre 2009 e 2011.

Segundo sua chefe à época, ele era um profissional dedicado, que levava os exercícios físicos muito a sério. Ele participava de um programa voluntário para treinar as crianças do bairro.

Seu pai morreu aos 49 anos, vítima de câncer. Após a perda, ele partiu em uma viagem pelo mundo que durou sete anos.

A viagem pela Europa e pela Ásia foi paga com dinheiro que ele ganhou ao investir em moedas virtuais, chamadas de criptomoedas. Pessoas próximas acreditam que sua radicalizaçãotenha ocorrido durante esse período.

Em uma dessas viagens, ele chegou a Coreia do Norte. O australiano foi fotografado durante uma visita a um monumento do país.

No manifesto, Tarrant diz que escolheu Christchurch como alvo há três meses.

“Eu só vim para a Nova Zelândia para viver temporariamente enquanto eu planejava e treinava, mas logo vi que o país era um alvo”, escreveu.

MENÇÃO AO BRASIL

Horas antes do ataque, o perfil de Tarrant em uma rede social publicou um manifesto no qual ele assume a autoria da ação e elenca líderes racistas como heróis.

No arquivo, intitulado “The Great Replacement” (a grande substituição), Tarrant elenca as influências que o levaram a cometer os ataques. Há inclusive uma menção ao Brasil.

O país aparece em uma seção intitulada “Diversidade é Fraqueza”, no qual Terrant diz que os países “diversos” ao redor do mundo são locais de “conflito social, político, religioso e ético”.

“O Brasil, com toda a sua diversidade racial, está completamente fraturado como nação, onde as pessoas não se dão umas com as outras e se separam e se segregam sempre que possível”, escreve.

O MANIFESTO

“Um homem comum, 28 anos, nascido na Austrália em uma família de classe trabalhadora e de baixo salário.” Assim se define Tarrant no texto de 73 páginas escrito em inglês precário, recheado de links da Wikipedia e publicado em uma conta no Twitter atribuída a ele.

Ele afirma que suas motivações incluíram “criar uma atmosfera de medo” e incitar a violência contra muçulmanos, descreve o ataque como um ato terrorista e diz que transmitiria a ação pela internet.

No arquivo, intitulado “The Great Replacement” (a grande substituição), Tarrant elenca as influências que o levaram a cometer os ataques.

O título do manifesto é uma referência ao livro de 2012 do polemista francês Renaud Camus.

A obra defende a teoria de que a maioria branca europeia está sendo substituída por imigrantes não brancos da África do Norte e da África Subsaariana.

Em linhas gerais, o australiano se posiciona como um nacionalista branco, contra a diversidade racial, apoiador de Donald Trump e do brexit, e inspirado pelo atirador da Noruega Anders Breivik, cujos ataques em 2011 vitimaram 77 pessoas.

O suspeito afirma que seus pais são de origem europeia e afirma que nos últimos dois anos sua visão de mundo “mudou dramaticamente”.

Ele também citou nominalmente Ebba Akerlund, 11, morta em um ataque em Estocolmo em abril de 2017 realizado pelo imigrante do Uzbequistão Rakhmat Akilov.

Os atos na Nova Zelândia seriam uma vingança pela morte da garota.

As armas usadas no ataque tinham símbolos e nomes de supremacistas brancos, como o de Darren Osborne.

Em 2017, o galês atropelou com uma van um grupo que saía de uma mesquita em Londres, matando uma pessoa e ferindo outras dez.

VIDEOGAMES

Em seu manifesto, Tarrant cita dois jogos de videogame como grandes influenciadores.

“Spyro: Year of the Dragon me ensinou o etno-nacionalismo”, afirma.

No jogo de estética infantil, lançado em 2000 para o console PlayStation, um dragão roxo deve recolher diamantes e ovos em florestas.

Já Fortnite o “treinou para ser um assassino e para fazer ‘floss’ aos cadáveres dos meus inimigos”.

‘Floss’ é o nome dado à dança que os personagens do jogo fazem quando comemoram suas vitórias.

O game, no qual um grupo de jogadores deve procurar armas e atirar uns nos outros, foi lançado em 2017 e teve grande repercussão, atraindo mais de 125 milhões de participantes em um ano.

O último sobrevivente é o ganhador do jogo.

PORTE DE ARMAS

A primeira-ministra neozelandesa, Jacinda Ardern, afirmou que a lei de controle de armas irá mudar na Nova Zelândia, um país que combina um baixo número de homicídios com a facilidade de se obter armamentos, um dia após massacre que deixou 49 mortos.

Qualificando os ataques contra duas mesquitas da cidade de Christchurch como “um dos nossos dias mais sombrios”, Arderns afirmou que considera uma proibição total a armas semiautomáticas.

O atirador obteve cinco armas legalmente e tinha licença para porte de armas.

Qualquer pessoa com mais de 16 anos no país pode pedir uma permissão para comprar armas. Cabe a polícia dar a autorização —em geral, apenas pessoas com histórico criminal, de uso de drogas ou de problemas psiquiátricos são barradas.

Em 2017, dos 43.509 pedidos de permissão, 43.321 foram aceitos, de acordo com a rede de TV britânica BBC. No total, mais de 238 mil pessoas no país de 4,7 milhões de habitantes têm acesso aos armamentos.

Com a permissão em mãos, um neozelandês pode comprar quantos fuzis (exceto os semiautomáticos) e espingardas quiser e não é necessário registrá-los em órgãos de controle.

As armas podem ser compradas com facilidade, incluindo pela internet ou em anúncios em jornal.

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