O Show da Vida discute agora a saúde no
país. Nessa área, o Brasil vive uma situação de contrastes. Algumas
cidades têm médicos, mas não oferecem estrutura. Outras têm postos de
saúde novinhos, equipados, mas médico nenhum quer trabalhar ali. Será
que existe solução?
Maria Raimunda de Souza está no sétimo mês de gravidez. Ela tem anemia e problemas de tireóide.
A gestante mora na pequena Ferreira Gomes, a 137 quilômetros de Macapá,
no Amapá. Ela precisa fazer um ultrassom, mas a Unidade Mista de Saúde,
criada para funcionar como um hospital e atender casos de emergência,
não tem o equipamento. Até agora, Maria não sabe o sexo e nem o estado
de saúde do bebê.
“Só Deus mesmo quem sabe”, comenta a dona de casa.
O doutor Vitor atende Maria no escuro,
no pequeno hospital, mantido pelo governo estadual e pelo SUS. As
constantes faltas de energia são apenas uma das carências da cidade de
5800 habitantes, que, em uma unidade, conta com apenas dois médicos. Mas
um deles está fora, fazendo um curso.
De segunda a sexta-feira, o doutor Vitor Hugo Lopes Rodrigues atende uma média de 40 pacientes por dia.
“Não temos raio-X, não temos um laboratório que ofereça todos os
exames que geralmente nos solicitamos. As vezes falta até fio de sutura,
as vezes nos não temos medicações básicas”, conta o médico.
A técnica em enfermagem Neuraci Lima
Pereira técnica trabalha há dez anos no hospital e também é vereadora na
cidade. Ela diz que sequer há roupa de cama para os 12 leitos.
“Nós não temos alimentação pra dar para o
paciente, não temos lençol, as enfermarias não tem ventilador e os que
estão instalados não funcionam. Então não temos como manter nenhum
paciente internado aqui”, afirma.
A falta de atendimento médico de qualidade não é problema só de vilarejos em regiões extremas. Em São Paulo,
terceira cidade em número de médicos por habitante no país, dona
Idália, de 73 anos, aguarda atendimento há três dias. Ela caiu da cama e
fraturou o braço.
Ela precisa fazer uma cirurgia, que, até
a última quinta-feira, não tinha sido marcada. A sobrinha conta que
dona Idália passa os dias em uma cama, em um corredor do Hospital
Municipal do Campo Limpo, na periferia da Zona Sul.
“Até agora não passou nenhum medico pra
olhar um raio-X que ela fez, disse que está com início de pneumonia e
não fizeram nada, continua do mesmo jeito que está”, diz a diarista
Camila dos Santos Almeida.
São Paulo tem 2400 vagas para médicos em
aberto, segundo a prefeitura. A carência vai dos grandes hospitais
públicos, como o que a dona Idália está internada, até os postos de
saúde.
Na semana passada, um dos 130 alunos de uma escola machucou o dedo,
um ferimento que poderia ser rapidamente tratado do outro lado da rua,
em um posto de saúde novinho. Mas a criança foi encaminhada para um
hospital porque o posto está fechado por falta de médicos.
São cinco consultórios, salas para
inalação e vacina bem equipadas. Estrutura para atender aos 12 mil
moradores do bairro. A Unidade Básica de Saúde do Jardim Rincão foi
entregue em setembro de 2012, pelo município. Todos os outros
funcionários já foram contratados. Menos os médicos.
“Se eu tivesse um posto aqui, que fosse pelo menos de dia, e tivesse um medico, já resolveria o problema”, afirma uma mulher.
O Supervisor de Saúde da região aponta falta de interesse.
“É uma região bastante conturbada, que tem bastante problema social. O
salário para o médico é em torno de R$ 13 mil”, diz o supervisor de
saúde da região de Pirituba e Perus João Marcondes da Silva Filho.Números do Ministério da Saúde indicam que o Brasil tem menos médicos do que necessário: 1,8 para cada mil habitantes. O índice é menor do que os de países como a Argentina Portugal e Espanha.
Esta semana, o governo anunciou a
abertura de 35 mil vagas até 2014. Se não conseguir preencher os postos
de trabalho com brasileiros, estrangeiros poderão se candidatar.
Nesse caso, segundo o Ministério, os contratos serão por prazo determinado.
Nesse caso, segundo o Ministério, os contratos serão por prazo determinado.
“Com autorização exclusiva pra atuar
naquela região. Não pode exercer medicina fora da periferia das grandes
cidades e dos municípios do interior. Com isso, não vai disputar vaga
nem mercado de trabalho com o médico brasileiro”, explica o ministro Alexandre Padilha.
Os estrangeiros não precisarão fazer
provas para revalidar o diploma obtido no exterior. E isso, o Conselho
Federal de Medicina não aceita.
“Isso é um perigo, é um risco. Nós vamos
fiscalizar atentamente cada ato, cada gesto desses médicos. Se for erro
médico, vamos puní-los exemplarmente. Vamos ao judiciário e vamos até
às cortes internacionais se for o caso”, afirma Roberto Luiz D’Ávila,
presidente do CFM.
Na opinião de um pesquisador de gestão em saúde, os médicos estrangeiros podem até ajudar, mas é preciso fazer mais.“Junto com os médicos que serão alocados nessas regiões, há que ter o compromisso firme, explícito das autoridades dos três níveis, federal, estadual e municipal, que serão destinados recursos pra que esses profissionais tenham efetivamente condições de atuar”, ressalta o professor da FGV Wilson Resende.
O governo do Amapá diz que iniciou em
2013 um programa de reestruturação e construção de mais unidades de
saúde. E, sem fixar prazo, afirma que a unidade de Ferreira Gomes é uma
das que serão reestruturadas.
Em São Paulo, a prefeitura informou em
nota que dona Idália foi avaliada pela equipe de cirurgia geral,
enquanto esteve no hospital do Campo Limpo. Depois de três dias, ela foi
transferida para o Hospital das Clínicas e deve ser operada na
terça-feira.
Camila fala com tristeza da situação da
tia: “Eu pago imposto. Ninguém está pedindo favor. A gente só quer o que
a gente paga, não é de graça. É um descaso, gente”.
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Saúde