Sobreviventes do incêndio no RS ainda correm risco, dizem médicos

Fumaça pode provocar doenças mesmo em quem não foi internado. Incêndio em discoteca de Santa Maria matou mais de 230 pessoas.

 A inalação de fumaça pelo corpo humano pode causar um colapso do aparelho respiratório e provocar a morte de uma pessoa. Foi o que aconteceu com grande parte das vítimas do incêndio que atingiu a danceteria Kiss, em Santa Maria (RS), e matou mais de 230 pessoas na madrugada deste domingo (27).
Além disso, médicos ouvidos pelo G1 afirmam que mesmo pessoas que não precisaram ser internadas após o incêndio -- ou seja, sobreviventes da tragédia que estavam na boate e aqueles que auxiliaram no resgate -- podem desenvolver doenças respiratórias graves dias após o incidente.
Segundo o pneumologista José Eduardo Afonso Junior, do Hospital Albert Einstein, de São Paulo, a fumaça aspirada pelas vítimas do incêndio da boate Kiss deveria conter substâncias tóxicas liberadas devido à queima de materiais inflamáveis, como a espuma do isolamento acústico presente no teto do estabelecimento, atingida por faíscas de efeitos pirotécnicos segundo relatos de testemunhas.
Mais de 90% das vítimas morreram por intoxicação respiratória e pelo menos 123 jovens seguem internados, alguns em estado grave.
Atenção aos sobreviventes
A combinação da fumaça com o calor proveniente das chamas causa danos diretos ao sistema respiratório, podendo provocar o óbito de quem estiver em um ambiente fechado.
Segundo José Eduardo Afonso Junior, nos próximos dias deve ser observada a ocorrência de sintomas como falta de ar, chiado no peito, febre, tontura ou enjoo em pessoas que estiveram dentro da boate ou trabalharam no resgate das vítimas.
Isso pode ser indício de uma possível intoxicação por substância química, que deve ser tratada com atendimento médico.
A fumaça quente pode causar uma inflamação que não é reversível, uma lesão que lembra muito uma queimadura de pele.
A pessoa que respirar o ar contaminado pode desenvolver uma bronquite ou ainda ter sequela para o resto da vida se o pulmão for afetado em um percentual acima de 50%, necessitando de tratamento com oxigênio por um bom tempo.
Além disso, as vítimas podem desenvolver, em até cinco dias, doenças perigosas como a pneumonia.
Sinusite
O médico otorrinolaringologista Richard Voegels, do Hospital das Clínicas da Universidade da USP (Universidade de São Paulo), explica que envolvidos no incidente podem apresentar também quadro de sinusite.
“A mucosa respiratória ficará irritada e a pele interna pode ter inflamação. Há sobrecarga de secreção, que pode ficar acumulada nos seios paranasais (face), evoluindo para uma sinusite”, afirma.
Voegels complementa dizendo que o ideal é que a pessoa lave bastante o nariz com soro fisiológico, para tirar possíveis partículas que possam ter entrado com a fumaça.
Ele aponta ainda para uma possível perda momentânea do olfato, quando a pessoa não consegue sentir aromas. “Isso pode acontecer por algumas horas após a aspiração de fumaça. Mas se o sintoma persistir, um médico deve ser procurado”, indica o especialista.
Morte por asfixia
No ar contaminado por fumaça está presente uma substância chamada monóxido de carbono, que invade a corrente sanguínea após um colapso do sistema respiratório. Lesões sérias no pulmão também podem ser provocadas.
A primeira reação do corpo é combater essas substâncias tóxicas que entram pelas vias respiratórias. Células de defesa começam a liberar enzimas, mas atacam as próprias células do pulmão, já contaminadas. A parede do alvéolo se rompe e, onde deveria haver ar, passa a haver sangue.
“Quando se inala muita fumaça com monóxido de carbono, a substância acessa o alvéolo [onde ocorre a troca gasosa entre o oxigênio, que entra no sangue, e o gás carbônico, que é retirado] e entra em contato com as hemácias do sangue, que transportam oxigênio para os órgãos. Isso impede a oxigenação do corpo e, em questão de minutosa pessoa pode morrer”, explica o especialista. Ele afirma ainda que cinco minutos sem respirar provoca parada cardiorrespiratória.
No caso do incêndio em Santa Maria, o fato de a boate estar lotada e com pouca luz dificultou ainda mais a circulação do ar e a visibilidade das pessoas, que entraram em pânico e não conseguiram manter a calma para sair da boate. De acordo com os Bombeiros, o controle emocional é importante na hora da emergência para se proteger e proteger os outros que estão por perto.
Em caso de fumaça, os bombeiros recomendam que as pessoas se abaixem o máximo que puderem para evitar o contato com a substância. Como a visibilidade é baixa, é importante usar as mãos como maneira de encontrar a saída de emergência. Quem sair desse ambiente de incêndio deve usar máscaras de oxigênio.

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