A contaminação de pacientes por superbactérias está preocupando médicos e pacientes do Hospital Estadual Ruy Pereira, em Natal (RN). A unidade, inaugurada em outubro de 2010, tem cerca de 85 leitos e é referência no atendimento a pacientes com problemas vasculares no Rio Grande do Norte. Na unidade são realizadas cirurgias eletivas e internações --há no local uma UTI (Unidade de Terapia Intensiva) com quatro leitos. Por conta da crise na saúde, com desabastecimento dos hospitais, greve dos médicos e falta de leitos nas unidades, o governo estadual decretou calamidade pública na urgência e emergência de todo o Estado no último dia 4. O poder público pretende resolver os principais problemas do setor em 180 dias –prazo de validade do decreto. Segundo profissionais ouvidos pelo UOL, o hospital Ruy Pereira não possui equipamentos adequados para tratar pacientes com infecções, o que leva a proliferação de bactérias de difícil tratamento. No dia da visita da reportagem ao local, na última quinta-feira (12), o médico plantonista Pedro Raimundo Souza contou que foram registradas duas mortes de pacientes por infecção de superbactérias. “Essas mortes estão ligadas às condições precárias do hospital”, disse, relatando uma série de problemas na unidade. Segundo o médico, duas superbactérias estão contaminando vários pacientes do hospital: a acinetobacter e a pseudomonas. Há falta de antibióticos para combater as infecções. “Quando fazemos o teste e é apontada uma superbactéria nós fazemos o isolamento do paciente em uma enfermaria. Mas acontece que, devido à insuficiência de equipamentos e instrumentos, que são compartilhados com todos os pacientes, a bactéria sai passando de um para o outro”, explicou Souza, citando que as duas bactérias são bastante resistentes a tratamentos. “É difícil o tratamento. O melhor remédio muitas vezes não faz efeito. A gente luta, mas na maioria a gente perde para a acinectobater.” O médico afirmou ainda que a bactéria fica mais resistente porque ocorrem faltas rotineiras de medicamentos para o tratamento. "O que ocorre também é que ministramos, por um determinado tempo, o antibiótico, mas o paciente fica sem a defesa. Quando o tratamento é interrompido, devido à falta da medicação, a bactéria fica mais resistente.” O médico plantonista Luciano de Morais Silva afirma que a UTI do hospital também sofre com o desabastecimento e desaparelhamento. “A gente está sem exame de raio-x há um ano. Todo paciente aqui a gente drena o tórax, acompanha com pneumonia, coloca e tira do respirador sem ter um exame. Ou seja, a gente faz tudo como herói, vendo apenas clinicamente.” O filho de um paciente de 70 anos, que não quis revelar o nome, relatou que o pai pegou duas superbactérias e está em estado grave. “Ele tem úlcera e foi internado. Depois, foi diagnosticado com infecção. Fizeram exame e foi detectado um tipo de superbactéria, e ele agora pegou outra aqui, nesse hospital”, afirmou. Sem equipamentos e material A contaminação em série, segundo os profissionais ouvidos pela reportagem, é causada pela falta de equipamentos para garantir o isolamento completo de contato. No hospital, faltam tensiômetros e otoscópios individualizados para os pacientes infectados. Termômetros também são considerados “artigos de luxo” na unidade. “Aqui, a gente faz que nem no interior: bota a mão e vê se está quente”, disse uma auxiliar de enfermagem. Os profissionais se queixam da falta de luvas, máscaras e até da escassez de lençóis. Além disso, muitas vezes falta álcool em gel para higienização. “É o atendimento deles [pacientes] que fica prejudicado, porque a gente precisa priorizar esses cuidados, mas temos também que pensar na nossa segurança. Infelizmente não temos como trabalhar sem material, sem o mínimo de condições”, disse Ivânia Martins, técnica de enfermagem da UTI. Medidas Em nota encaminhada na manhã desta terça-feira (17) ao UOL, a Secretaria de Saúde do Rio Grande do Norte confirmou a existência de bactérias na unidade, mas negou a existência de um surto de superbactérias no Hospital Ruy Pereira, como alegam os profissionais. No texto, a presidente da Comissão de Infecção Hospitalar do hospital, Janaina Pinto, disse que "surto é um aumento da incidência, além do esperado.” “No hospital Ruy Pereira existe uma quantidade de bactérias, como em todo hospital, quantidade preconizada e acompanhada pela Anvisa", afirma. Ainda segundo o texto, ações relacionadas aos cuidados preventivos já foram tomadas pela comissão de controle, “como a troca dos prontuários, que atualmente são de acrílico, palestras de lavagem das mãos, visitas semanais as UTIs, como também o acompanhamento da liberação de antibióticos para os pacientes.” Segundo o "Plano de Enfrentamento dos Serviços e Urgência e Emergência do Rio Grande do Norte", divulgado no último dia 4, quando decretou calamidade, o hospital Ruy Pereira deve ganhar mais 25 leitos até o início de agosto, assim como outras seis vagas de UTI em 90 dias. Com isso, a unidade deve ajudar a desafogar o Hospital Walfredo Gurgel, referência no atendimento em urgência e emergência em Natal. Sobre a falta de medicamentos, insumos e equipamentos, o governo também informou que vai investir R$ 5 milhões para garantir o "abastecimento imediato das necessidades básicas dos hospitais da rede pública estadual". O governo do Estado informou ainda que os gestores da área metropolitana de Natal já foram convocados para pactuar medidas para a rede de urgência e emergência. Segundo o secretário Nacional de Atenção à Saúde, Helvécio Magalhães, o plano elaborado para o Estado deve resolver o problema em médio prazo e “mudar por completo” o cenário de caos da saúde. "Decretar calamidade foi uma atitude debatida conosco [do Ministério da Saúde] e uma ação corajosa e determinada do governo do Estado. Com isso, teremos várias contratações de leitos, relocação de pessoal, obras estruturantes agilizadas, pois a situação é grave, e a população está sofrendo muito. Nós temos um plano em curto, médio e longo prazos. É um plano muito bem elaborado e acreditamos que o Estado vai dar uma virada”, finalizou. |
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